MEU PRESENTE DE NATAL

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Esta semana, fiz mais uma limpa, entre tantas, na minha casa. Papéis e livros parecem dar cria aqui em casa. Separei muitos bons livros em inglês e português para decidir o que fazer. Uma amiga viu meus livros e disse, “Pra que guardar livros com tantas bibliotecas, livros online, e o google ‘sabe-tudo’?” Quase ninguém quer ter livros em casa, hoje em dia. Até o meu sonho de ter uma biblioteca em casa, se foi…

Ah, amados, em Angola é muito diferente! Tenho amigos me pedindo livros didáticos, livros evangélicos, tudo que os possa ajudar! Prometi fazer alguma coisa, mas infelizmente ainda não cumpri minha promessa. Juntei várias caixas de bons livros, mas não temos recursos suficientes para enviá-los. Nem vale a pena mandar algumas caixas. Fica muito mais em conta se enchermos um container para mandar. O dinheiro, Deus proverá!

Sobre este assunto tenho uma grande vitória pra contar. Ganhei o melhor presente neste Natal! Estou muito mais feliz do que qualquer um de vocês, acredite. Venho trabalhando há alguns anos para ajudar Angola na área da literatura. Eles não tem imprensa evangélica e, portanto, nem todo crente, nem todo pastor pode ter sua Bíblia. Há uma grande carência de Bíblias em português e nos mais variados dialetos angolanos. O Pastor Mabanza Daniel, Presidente de uma das Convenções Batistas em Angola, na tentativa de solucionar o problema, preparou uns livros de exercícios bíblicos, que chamam de Manual de Catequese, e me pediu ajuda na revisão ortográfica e formatação. Fiz o melhor que pude. São perguntas doutrinárias respondidas com versículos bíblicos que os irmãos angolanos devoram e sabem de cor. Depois de pronto, um dos meus pastores, Pastor Bruno Ferreira, doou a impressão de alguns deles em forma de apostila, que levamos na viagem à Angola. E fizemos mais algumas cópias por lá. Mas isso não resolveu o problema. São milhares de pessoas esperando o seu livrinho. A primeira vez que expus essa necessidade na minha igreja, apenas um irmão ofereceu ajuda especificamente para isto. Mas eu fiquei muito feliz. Eu sabia que a nuvenzinha era sinal de chuva. Em resposta à oração, Deus tocou no coração do meu amigo Pastor Gênison Ferreira e sua igreja para doar a impressão de 10 mil livros de exercícios bíblicos em português e em kikongo, incluindo o Manual do Ministro que tanto ajuda os pastores que não tem acesso a uma melhor formação, na realização de cerimônias fúnebres, casamentos, etc. Os livros já estão na gráfica.

Glória a Deus! Obrigada amigo! Obrigada Igreja do Caminho! Se eu estou feliz, como está o Senhor Deus, então! Chovam bençãos sobre vocês!

FORÇA LUANDA, TUDO PASSA!!

Luanda já foi uma cidade bonita. “Mas o sofrimento fez dela uma cidade feia. Há lixo nas ruas esburacadas e boiando nos esgotos a céu aberto, carcaças de automóveis envelhecendo ao sol, muros onde se lê apelos inúteis do tipo “Proibido mijar” e “Proibido deitar lixo” ou “Nós queremos a paz em Angola” e “Força Angola, tudo passa”.  (Angola, 38 anos de guerra – José Rezende Jr.)

Conheci Luanda já bem recuperada, mas ainda longe de ser a cidade que poderia ser. Tentei achar uma maneira de definir Luanda e achei várias: capital da alegria, da esperança, do caos, do sofrimento, da corrução…

Até hoje não se deram ao trabalho de por nome nas ruas e numerar as casas em Luanda, depois da guerra. Na maioria dos bairros, ninguém tem endereço. Quase impossível enviar uma correspondência para os amigos que lá deixei. Por outro lado, quase todo mundo tem um celular, que funciona como endereço e quase um documento de identidade. Se eu quiser mandar alguma coisa pelo correio, escrevo o número do telefone do destinatário no envelope e o correio se comunicará com a pessoa para ir buscar sua encomenda.

Um fato interessante aquece a economia em Luanda. Parece que todo mundo está na rua vendendo alguma coisa. Roupas usadas, sapatos usados, bonés, óculos, roupas de cama, toalhas, vi de tudo por lá. São as doações vindas de outros países. Tudo se transforma em mercadoria para vender. Isso tem o lado bom, afinal todo mundo está ganhando um trocadinho, já que um mínimo da população tem oportunidade de emprego. São milhões de pessoas nas ruas e nas praças vendendo de tudo que você imaginar. Numa das igrejas onde trabalhamos, de 700 pessoas apenas 3 a 4 delas tem um emprego.

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Créditos foto: Jorge Alberto (opatifundio.com/site/?p=1471)

“Em Luanda existem três mercados populares muito famosos. Um deles é o Roque Santeiro, o maior mercado a céu aberto da África… Há também o mercado São Paulo e o mais famoso de todos: o Mercado da Rua. O Roque Santeiro fica perto do porto e  vende de tudo, mas quando eu digo tudo é tudo mesmo… Somos aconselhados a não parar ali. Aliás, pulo (branco) entrar ali sozinho é pedir para ser assaltado. Nem os próprios angolanos querem nos acompanhar até lá.” (opatifundio.com/site/?p=1471)

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Uma amiga angolana me disse que a maioria das doações que chegam à Angola destinadas ao povo carente vai parar numa esteira, num pedaço de tecido ou carrinho de pedreiro pra ser vendido na rua. Eles compram os “fardos” de coisas usadas e saem vendendo nas ruas e praças, enquanto não tem que sair correndo para escapar da polícia. Às vezes a “lojinha” é apenas um varal na porta do barraco. O pior de tudo é ver carne e pão sendo vendido em carrinhos de pedreiro à descoberto pelas ruas. Cobertos de poeira.

GUERRA… SÓ SABE QUEM VIVEU… E SOBREVIVEU.

Há tempos idos, Angola era considerada a pérola da África, quando os  colonizadores portugueses a governaram (e a escravizaram…). Mas chegou a hora de passar as rédeas para os próprios angolanos, o que deu início a uma Guerra pela Independência, ou Guerra Colonial de 1961 a 1975. Após a independência, seguiu-se a Guerra Civil pelo poder. No total, 38 anos de guerra. Dois partidos se mutilaram, se arruinaram, se aniquilaram, matando três quartos da população de 1975 até o ano 2002, quando resolveram dar uma trégua. Muito sangue foi derramado, muitas famílias desfeitas, grande parte do país foi destruída. Como resultado, as estatísticas dão conta de 10 mulheres para cada homem em Angola, depois da guerra (as mulheres são a grande maioria da Igreja em Angola).

“Uma tragédia pode durar uma hora, uma semana, um mês, ou apenas um minuto. Uma tragédia pode ser um acidente, uma enchente, um terremoto, uma guerra, ou várias tragédias em cadeia. Em Angola, aconteceram milhões de tragédias com o nome de guerra civil e durou 38 anos: 2 milhões de mortos, 1,7 milhão de refugiados, milhares de órfãos, 200 pessoas mortas de fome por dia, 80 mil crianças, velhos, homens e mulheres mutilados pelas milhões de minas semeadas pelo país afora …e na maioria das vezes, não havia tempo para velório. Muitos corpos passaram meses estendidos nas ruas, até que deles nenhuma carne mais restasse. Ficavam lá, apodrecendo. De vez em quando, passava um cachorro magro com uma mão, um crânio, uma costela de gente na boca.” (Angola, 38 anos de guerra – José Rezende Jr.)

Este é um dentre milhares de textos que retratam o que é uma guerra. No entanto, por mais que a gente leia e se informe, nunca vamos saber exatamente o que é uma guerra, a não ser quem passou por ela… e sobreviveu. Por esta razão posto aqui algumas fotos de blogs, com os respectivos endereços, para quem tiver interesse de saber mais.

Durante os dias que estivemos em Angola, entrevistamos vários irmãos, irmãs e pastores que sobreviveram a essa guerra e nos emocionamos ao ouvir testemunhos incríveis do cuidado de Deus no meio do horror. O resultado será um livro que esperamos chegue às suas mãos para informá-lo melhor da necessidade de ajudar a Igreja do Senhor, parte da sua família cristã em Angola.

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Chacina de trabalhadores em Nambuangongo        Foto Horácio Caio. http://petrinus.com.sapo.pt

NOSSA VIAGEM MISSIONÁRIA

Somos privilegiados pela benção de ter conhecido Angola e os irmãos da UEBA (União Evangélica Batista em Angola). Deus nos enviou com sua mão poderosa àquele país para uma tarefa que apenas começou.Tudo que vimos e ouvimos ficará no nosso coração pra sempre. Por muitos dias após nosso retorno ao Canadá, só pensamos em Angola; parece que ainda ouvimos as flautas, os corais, os louvores, a até o barulho do trânsito nas ruas. Aprendemos muito com os irmãos angolanos. Decidimos ajudar e fomos ajudados. Pensamos em ensinar e aprendemos muito. A alegria, o louvor, o carinho e a disposição de servir dos angolanos são contagiantes.

Os testemunhos que ouvimos de alguns anciãos e pastores acerca do que passaram durante a guerra, nos fez chorar e nos moveu a fazer algo que perdure para outras gerações. A pedido dos pastores de lá, comecei a trabalhar na preparação de um livro sobre a sobrevivência da igreja de Cristo em Angola durante os anos da guerra civil. São muitos depoimentos e testemunhos tão distantes do nosso contexto frio e comodista, e tão próximos do poder miraculoso de Deus!

As irmãs angolanas são heroínas. Heroínas de guerra. São guerreiras. Lutam pela igreja do Senhor e pela própria sobrevivência em condições totalmente adversas. Elas estão no nosso coração e decidimos que faremos alguma coisa por elas, se o Senhor permitir. Temos profunda gratidão especialmente por Madalena, Macaia, Mafuta, e Josefina que se dedicaram com tanto carinho a nos receber. Alguns irmãos se destacaram também na disposição de servir: Cláudio, Antonio e Silva, principalmente.

Minha grande admiração pelos pastores da UEBA. Varões de Deus! Homens de fé e visão. A grande maioria trabalha incansavelmente, sem salário da igreja, em jejum e oração para tornar o reino de Deus conhecido entre seus irmãos. Somos gratos ao Pastor Filó Felipe pela dedicação total durante 20 dias. Também ao Pastor Kiala, Pastor Ramos, Pastor Dilubanza, Pastor Vununa Pedro e outros.

Os jovens! Além de fortes, os jovens angolanos são famintos do Pão do Céu, e da Palavra de Deus. São sedentos da Água Viva. São inteligentes, carinhosos, e sonhadores. Nunca pensei que um dia falaria por 3 horas sem intervalo a jovens! Deus já havia preparado tudo antes mesmo de ser convidada pra falar. Minha admiração e palavra de estímulo para Higídio, Madaleno, Mateus, Clemina, Luíza, Pedro, e muitos outros que não me recordo agora.

Impossível relatar tudo que vivemos nestes 20 dias. Fiquei desejosa de ajudar a escola da UEBA na formação de tantas crianças e jovens. Oro que o Senhor ainda me conceda esta benção. Temos falado sobre Angola em toda oportunidade. Vocês serão um exemplo aonde formos. Deus os abençoe ricamente.

Finalmente, uma palavra de gratidão à maneira carinhosa como fomos recebidos na casa do Cláudio, Madalena, Pedro, Luíza e Olívio. Deus os recompense. Obrigado, UEBA.

No amor do Senhor,

Daisy e William